A vida tem a cor que você pinta. (Mário Bonatti)

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

.Desabafo.

O que mais me incomoda não é a hipocrisia das pessoas. E sim a negação do ser hipócrita. Pois todos somos, em maior ou menor grau, hipócritas.

Não tenho estômago para aqueles que se escondem atrás de um livro, de frases moralistas, de perfeitas denominações, de lindos rótulos e/ou superficialidades aparentemente poderosas. Pois esses se contradizem em suas atitudes diárias, não são capazes de ao menos respeitar um ser humano como se deve ou reconhecer o que há de bom no outro.

Não suporto contradições colossais entre o que se diz e o que se faz. Por isso, por favor, não me venha com hipocrisias baratas, pois para me convencer é preciso de muito, mas muito talento e atitude, inclusive com possíveis simulações e manipulações diárias. Do contrário, terei de ser como você e fingir acreditar nas suas tolas palavras. E talvez eu não precise disso.


quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Desabrochar

Ao acordar, debruçou-se sobre sua agenda para constatar os seus compromissos diários. Trabalho, trabalho, trabalho. Sentiu-se esmagada por sua própria vida não vivida e desaproveitada. Ao sair do banho decidiu que sim, iria atrás daquilo que havia submergido há anos: a sua liberdade e os seus estímulos para viver com intensidade cada minuto.
Saiu na direção contrária ao seu escritório. E, quando deu por si, estava o mais próximo possível de um ataque de nervos, que eclodiria
em risos, palavrões, choros, pontapés e, quem sabe, alguns gritos de puro desespero.
Deu-se conta de tamanho impulso, pensou rapidamente nas crianças que esquecera de acordar, alimentar e enviar à escola. Riu e pensou que isso não faria tanta diferença em suas vidas. Elas detestavam a obrigação de ir à escola todos dias.
Nesse exato momento, avistou Paula, uma amiga de infância. Fingiu que não a vira, pois do contrário seria obrigada a demonstrar satisfação e contentamento. E hoje era um dia para não encontrar-se com ninguém. Hoje, o dia era seu, dedicado a si e a seus desejos.
Passou
rapidamente pelo centro da cidade, comprou um novo cachecol azul – pois do mesmo modelo ela já tinha o verde, o preto, o lilás e o amarelo. Sim, faltava o azul. Mordeu alguns morangos na feira, apalpou lindas maçãs vermelhas, sorriu para o mundo, conversou com os mendigos, sentiu compaixão dos pés descalços das crianças de rua e sensibilizou-se com a tristeza estampada na cara de todos os transeuntes. Após andar quatro horas sem parar muito para pensar no que estava fazendo, nutrir-se da beleza e fatalidade que habitam a cidade, decidiu ir ao cinema. Era o seu presente de aniversário, ainda que a data tivesse passado há oito meses. Presentear é sempre um prazer.
Exausta, no final do filme percebeu que o seu dia fora inútil, talvez infértil e até banal. Isso a deixou feliz e satisfeita, há tempos precisava de um dia como esse. Mas há muito mais tempo sabia que desde então jamais voltaria à trivialidade de sua agenda diária, tampouco à banalidade de sua rotina. Ser livre para viver, é o que sentia no mais íntimo do seu ser.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Ponto final.

Sabíamos que aquela escada simbolicamente separaria os nossos destinos. Sabíamos sem ao menos entender o porquê. Nós a descíamos lado a lado, passos cadenciados, sucessivos, afoitos. Eu, seguia firme, pesado, ainda que a sensação fosse a de pisar em nuvens. Ela, delicada, pés leves, como quem flutua, mesmo com os pés no chão. Degrau a degrau, silêncio absoluto. Éramos ligados por uma força destrutiva e vital, que nos mantinha eretos, livres, presos um ao outro - enquanto os corpos se repeliam. O desfecho, afinal. Eu, caí estatelado no chão à procura de um novo sentido para os velhos sentimentos. Ela, simplesmente alçou voo para nunca mais voltar. Enfim, só(s).

sábado, 30 de julho de 2011

Fracassar é preciso.


Sim, eu também sou um fracassado. Quando tento fazer algo e não consigo; quando planejo sem os pés no chão; quando não atinjo simples objetivos cotidianos; ou quando não dou conta da grandiosidade de meu ser.

Mas não se iluda. Sou um fracassado assumido e apenas em parte.

Enquanto fracasso, ou quando fracasso, parte de mim fica desiludida, descrente e desolada. Em contrapartida, todas as outras partes de mim sabem que o fracasso só vem para os corajosos, pois corajosos são aqueles que, mesmo na incerteza de não fracassar, tentam. Desesperadamente tentam.

Todas as outras partes, ainda, sabem que diante de um fracasso há sempre o desejo de não fracassar. Fica a semente plantada para o não-fracasso que está por vir. Sendo assim, se todas as minhas partes se comprimissem e tentassem ser apenas uma, eu seria - a cada fracasso - uma pessoa fracassada, pois não teria partes para me salvar do desolado fracasso.

Entretanto, teimosamente, junto-me, todos os dias, para ter-me inteiro, vivo, forte, frutífero e uno. Mas, despedaço-me, dia a dia, para me reencontrar em mim, detalhe por detalhe, no sim e no não, na vaidade e na verdade.

Francamente, fracassar é o que me impulsiona a comprar uma briga comigo mesmo. Hoje, fracasso. Amanhã, guerra. Depois, vencedor de mim. Sempre regresso ao meu eu não fracassado. Travo lutas contínuas e não abro mão desta odisseia. Acabo vencedor.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

O amor não diminui, mas multiplica.

“No encontro entre um eu e um tu, uma terceira pessoa de existência própria se estabelece. Nossos olhos não podem enxergá-la, mas a nossa sensibilidade nos aponta para ela. O nós é o que sobra do encontro entre o eu e o tu. Talvez seja por isso que os outros despertem simpatias e antipatias. Gostamos mais de estar com uns que com outros justamente por causa disso. O que nos atrai no outro é a terceira pessoa que conseguimos fazer nascer com o nosso encontro.
Esse processo de agregação possibilita ao ser humano o crescimento de seu horizonte de sentido. Tornamo-nos mais ricos com a presença dos que nos agregam. Relações saudáveis são relações que nos devolvem a nós mesmos – e, o melhor, devolvem-nos melhorados. O outro, ao passar pela nossa vida, encontra-se com nossa subjetividade. Ao estabelecer conosco uma relação, ele está nos permitindo adentrar o seu território subjetivo. Esse encontro faz surgir uma terceira pessoa, o nós. Respeitadas as subjetividades, isto é, as pessoas não deixam de ser elas mesmas, o encontro humano alcança o seu poder de integrar as partes, entrelaçando-as sem que elas se confundam.

O amor talvez seja isso. Encontro de partes que se completam, porque se respeitam. E, no ato de se respeitarem, ampliam o mundo um do outro. O recém-chegado não tem o direito de reduzir o mundo de quem se deixou encontrar. O amor não diminui, mas multiplica.” (Fábio de Melo, em “Quem me roubou de mim? – O seqüestro da subjetividade e o desafio de ser pessoa. ”)

SIM, sejamos todos pelo amor e pelas relações saudáveis.

Um grande beijo a todos aqueles que amo incondicionalmente. A todos aqueles que acrescentam algo de bom a minha vida, dia após dia.

http://www.youtube.com/watch?v=i8yx0AeEGvs

terça-feira, 17 de maio de 2011

"O fato de que todo amor possua sua profunda tragédia não é motivo para não mais amar!" Hermann Hesse

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Nada como terminar a segunda-feira relendo, cuidadosamente, um livro de Clarice Lispector e se deparar com um trecho tão bonito quanto este. Embriagai-vos com estas palavras...

“Algumas noites depois estava dormindo. E embora parecesse contradição, suavemente de repente o prazer de estar dormindo a acordara num macio sobressalto. Ficou deitada algum tempo e ainda sentia o gosto no corpo todo daquela zona rural onde subsolarmente ela espalhara das raízes os tentáculos de algum sonho. Certamente, aliás, fora um sonho bom que a despertara.

Levantou-se e foi beber um copo d’água, sem querer acender as luzes, procurando orientar-se na escuridão que não era total por causa da luz forte da casa vizinha. Eram apenas onze horas da noite. Como fora para a cama às dez, dormira apenas uma hora, acordada pelo prazer de dormir.

Foi beber devagar o copo d’água no terraço. Sentiu pelo cheiro do ar e pela inquietação dos ramos das árvores que ia chover dali a pouco. Não se via a lua. O ar estava abafado, o cheiro de jasmim vinha forte do jasmineiro da vizinha. Lóri ficou de pé no terraço, um pouco sufocada pelo perfume intenso. Através da embriaguez do jasmim, por um instante uma revelação lhe veio, sob a forma de um sentimento – e no instante seguinte ela esquecera o que soubera através da revelação. Era como se o pacto com Deus fosse este: ver e esquecer, para não ser fulminada pelo intolerável saber.

Ali em pé na semi-escuridão do terraço, de repente mais suave, veio-lhe outra revelação que durou pois era o resultado intuitivo de coisas que ela pensava antes racionalmente. O que lhe veio foi a levemente assustadora certeza de que os nossos sentimentos e pensamentos são tão sobrenaturais como uma história passada depois da morte. E ela não compreendeu o que queria dizer com isso. Ela o deixou ficar, ao pensamento, porque sabia que ele encobria outro, mais profundo e mais compreensível. Simplesmente, com o copo de água na mão, descobria que pensar não lhe era natural. Depois refletiu um pouco, com a cabeça inclinada para um lado, que não tinha um dia-a-dia. Era uma vida-a-vida. E que a vida era sobrenatural.

Naquela hora da noite conhecia esse grande susto de estar viva, tendo como único amparo apenas o desamparo de estar viva. De forte que se amparava no próprio desamparo. De estar viva – sentiu ela – teria de agora em diante, que fazer o seu motivo e tema. Com curiosidade meiga envolvida pelo cheiro de jasmim, atenta à fome de existir, e atenta à própria atenção, parecia estar comendo delicadamente viva o que era muito seu. A fome de viver, meu Deus. Até que ponto ela ia na miséria da necessidade: trocaria uma eternidade de depois da morte pela eternidade enquanto estava viva.

Até que teve fome mesmo, foi buscar uma pêra e voltou ao terraço. Ela estava comendo. Sua alma humana era a única forma possível de não chocar desastrosamente com a sua organização física, tão máquina perfeita esta era. Sua alma humana era também o único modo como lhe era dado aceitar sem desatino a alma geral do mundo. A engrenagem falhasse por meia fração de segundo, ela desmancharia em nada.

Apesar da ameaça de chuva iminente e da angústia que o jasmim sufocante já lhe estava dando, descobria, descobria. E não chovia, não chovia. Mas a hora mais escura precedeu aquela coisa que ela não queria sequer tentar definir. Esta coisa era uma luz dentro dela, e a essa chamariam de alegria, alegria mansa.

Ficou um pouco desnorteada como se um coração lhe tivesse sido tirado, e em lugar dele estivesse agora a súbita ausência, uma ausência quase palpável, do que era antes um órgão banhado pela escuridão da dor.

Porque ela estava sentindo a grande dor. Nessa dor havia porém o contrário de um entorpecimento: era um modo mais leve e mais silencioso de existir. Quem sou eu? perguntou-se em grande perigo. E o cheiro do jasmineiro respondeu: eu sou o meu perfume.

Viu que, igual ao balançar inquieto das árvores da casa vizinha, também ela estava dócil, inquieta. Organizara-se para se consolar da angústia e da dor. Mas como era que se consolaria da mistura de simples e tranquila alegria com a angústia? Ela não estava habituada a prescindir do consolo.

Então começou finalmente a chover.

Antes uma chuva rala, depois tão densa que fazia barulho em todos os telhados.

Já sei, pensou de repente. Soube que estava procurando na chuva uma alegria tão grande que se tornasse aguda, e que a pusesse em contato com uma agudez que se parecia com a agudez da dor. Mas fora inútil a procura. Estava à porta do terraço e só acontecia isto: ela via a chuva e a chuva caía de acordo com ela. Ela e a chuva estavam ocupadas em fluir com violência.

Quanto duraria esse seu estado? Percebeu que com essa pergunta estava apalpando seu pulso para sentir onde estaria o latejar dolorido de antes.

E viu que não havia o latejar da dor como antigamente. Apenas isso: chovia fortemente e ela estava vendo a chuva e molhando-se toda.

Que simplicidade.

Nunca imaginara que uma vez o mundo e ela chegassem a esse ponto de trigo maduro. A chuva e Lóri estavam tão juntas como a água da chuva estava ligada à chuva. E ela, Lóri, não estava agradecendo nada. Não tivesse ela, logo depois de nascer tomado por acaso e forçosamente o caminho que tomara – qual? – e teria sido sempre o que realmente estava sendo: uma camponesa que está num campo onde chove. Nem sequer agradecendo ao Deus ou à Natureza. A chuva também não agradecia nada. Sem gratidão ou ingratidão, Lóri era uma mulher , era uma pessoa, era uma atenção, era um corpo habitado olhando a chuva grossa cair. Assim como a chuva não era grata por não ser dura como uma pedra: ela era a chuva. Talvez fosse isso, porém exatamente isso: viva. E apesar de apenas viva era uma alegria mansa, de cavalo que come na mão da gente. Lóri estava mansamente feliz.

E de súbito, mas sem sobressalto, sentiu a vontade extrema de dar essa noite tão secreta a alguém. E esse alguém era Ulisses. Seu coração começou a bater forte, e ela se sentiu pálida pois todo o sangue, sentiu, descera-lhe do rosto, tudo porque sentiu tão repentinamente o desejo de Ulisses e o seu próprio desejo. Permaneceu um instante em pé, por um instante desequilibrada. Logo seu coração bateu ainda mais depressa e alto porque ela compreendeu que não adiaria mais, seria agora de noite.

Pegou na bolsa o endereço dele escrito no guardanapo, vestiu a capa de chuva sobre a camisola curta, e no bolso da capa levou algum dinheiro. E sem pintura nenhuma no rosto, com o resto dos cabelos curtos caindo sobre a testa e a nuca, saiu para tomar um táxi. Fora tudo tão rápido e intenso que não se lembrara sequer de tirar a camisola, nem de se pintar.”

LISPECTOR, Clarice. Uma aprendizagem ou O livro dos Prazeres. Rio de Janeiro: Francisco Alves Editora, 1994.

=)

domingo, 6 de março de 2011

Mais um desvario.

As palavras e os seus possíveis sentidos.

___Ou as necessidades básicas do nosso dia a dia.

___ O AMOR,

___ sinônimo de

______ · Respeito.

___ · Afeto.

___ · Atenção.

___ · Sinceridade.

___ · Delicadeza.

___ · E, principalmente, paciência, já que ele tudo suporta.

___A TROCA

___ · De experiências.

___ · De carícias.

___ · De carinho.

___ · De reconhecimentos

___ · E de respeito.

___ O CONTATO

___· Despretensioso.

___ · Com segundas intenções.

___ · Por prazer.

___ · Por compaixão.

___ · Para dividir.

___ · E para o crescimento pessoal.

___ O INDIVIDUAL,

___ necessário para o

___ · Autoconhecimento.

___ · A autocrítica.

___ · A auto-apreciação / depreciação.

___ · E para o auto-reconhecimento.

___ O COLETIVO,

___ Essencial para

___ · Preencher lacunas, trocar, dividir, compartilhar.

___ · Acrescentar bagagem às nossas histórias.

___ · Para completar ... ou transbordar, quando necessário, a nossa vida.

___ A ARTE

___ · Para a transformação.

___ · Como incentivo.

___ · Como "ponte" para o autoconhecimento.

___ · Reflexão.

___ · Prazer. Puro prazer.

___ · Reconhecimento de si no outro.

___ · Reconhecimento do outro, nele mesmo.

___ · Para ampliar os modos de ver.

___ E assim, viver... dia após dia. Nutrindo-nos desses significantes tão significáveis... rsrs...


*** Boa semana a todos.